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CARNES E DERIVADOS

CARNES E DERIVADOS


FATORES ANTE E POST MORTEM QUE INFLUENCIAM NA
QUALIDADE DA CARNE BOVINA

 Segundo, Pedro Eduardo de Felício*
1. INTRODUÇÃO
Um produto de qualidade é aquele que atende perfeitamente, de forma
confiável, acessível, segura, e, no tempo certo, às necessidades do cliente1. No caso
do produto ser um alimento como a carne bovina, e o cliente ser um consumidor
moderno, muito seletivo, poder-se-ia adaptar esta definição de modo a incluir valor
nutritivo, sanidade e características organolépticas.
Ao abordar o mesmo tema em outro evento2, em 1993, os atributos de
qualidade da carne foram classificados em: a) qualidade visual: aspectos que atraem
ou repelem o consumidor que vai às compras; b) qualidade gustativa: atributos que
fazem com que o consumidor volte ou não a adquirir o produto; c) qualidade
nutricional: nutrientes que fazem com que o consumidor crie uma imagem favorável
ou desfavorável da carne como alimento compatível com suas exigências para uma
vida saudável, e d) segurança: aspectos higiênico-sanitários e a presença ou não de
contaminantes químicos, como resíduos de pesticidas.
Depois, os fatores que influenciam na qualidade visual e gustativa foram
subdivididos em duas categorias: os ante mortem, ou intrínsecos, e os post mortem,
ou extrínsecos. Na primeira categoria, encontram-se os fatores vinculados ao
genótipo dos animais e às condições ambientais em que se desenvolveram. Na
segunda, estão aqueles que se confundem com os procedimentos técnicos adotados
pelos matadouros-frigoríficos e demais segmentos, até o consumidor final.
Neste trabalho pretende-se apresentar uma revisão atualizada do anterior,
seguida de algumas considerações gerais sobre confiabilidade, qualidade nutricional
e segurança.
2. PROPRIEDADES FÍSICAS DA CARNE
Logo após o abate do animal, tem início, na musculatura estriada, uma série
de transformações químicas e físicas que culminam na rigidez da carcaça, é o rigor
mortis. Este processo, denominado conversão do músculo em carne, não pára aí,
mas prossegue com degradações enzimáticas e desnaturação protéica, causando
uma pseudo-resolução do rigor mortis, que tornará menos rígida a carcaça. Pardi et
al. 3 assinalaram que o referido processo tem duração variável, podendo conduzir a
carne à elementarização, dependendo dos métodos de conservação utilizados.
O processo de conversão do músculo em carne, com diferentes graus de
degradação enzimática e desnaturação de proteínas, pode resultar em marcantes
* Professor do Departamento de Tecnologia de Alimentos da FEA-Unicamp, CP 6121 Campinas SP.
FELICIO, P.E. de. Fatores que Influenciam na Qualidade da Carne Bovina. In: A. M. Peixoto; J. C. Moura; V. P. de
Faria. (Org.). Produção de Novilho de Corte. 1.ed. Piracicaba: FEALQ, 1997, v. Único, p.79-97.
2
variações nas propriedades da carne, como a capacidade de retenção de água, cor e
firmeza da carne fresca; maciez, sabor e suculência da carne preparada para
consumo, e capacidade de emulsificação das matérias primas, rendimentos de
processo e cor dos produtos processados.4 Essas últimas propriedades, referentes
ao processamento, são comumente agrupadas sob o termo: qualidade tecnológica da
carne, cujo estudo foge ao escopo deste trabalho, principalmente porque suas
alterações atingem com maior intensidade e frequência a carne da espécie suína.
Embora existam alguns fatores, como a idade ou maturidade fisiológica e os
métodos de cocção, que influenciam nas propriedades físicas da carne sem afetar o
processo de conversão, praticamente todos os outros causam alterações no
processo, seja porque modificam a curva de declínio de pH em função do tempo post
mortem, seja porque promovem - ou permitem que ocorra - o encolhimento das
miofibrilas (estrutura contrátil da célula muscular), em grau variável, durante o
estabelecimento do rigor mortis, ou, ainda, porque influenciam na velocidade ou na
extensão da proteólise enzimática, durante a maturação.
3. FATORES ANTE MORTEM
Dentre os vários fatores intrínsecos ao animal, que constituem a expressão de
seu genótipo e das interações desse com o meio ambiente, serão discutidos aqui o
efeito do estresse, da genética (raças), da alimentação e da idade de abate. O fator
sexo/idade da castração de machos, embora importante, não será apresentado neste
trabalho, exceto por uma ou outra observação indispensável.
3.1. Estresse e declínio de pH
Se, por um lado, o estresse que atinge os suínos - horas ou segundos -
antes do abate, constitui-se na mais marcante causa de variação das propriedades
da carne dessa espécie, por outro lado, nos bovinos, tal influência é muito menos
importante. Mesmo assim, alguns agentes de estresse, como transporte, jejum
prolongado, condições climáticas severas, e o comportamento sexual dos machos
inteiros, podem resultar em rigor mortis atípico, com grandes prejuízos da qualidade
da carne.
Quando os bovinos são acometidos de estresse pré-abate, a reserva de
glicogênio dos músculos desses animais pode ser parcial ou totalmente exaurida.
Como consequência, o estabelecimento do rigor mortis se dá na primeira hora,
mesmo antes da carcaça ser levada à câmara fria, porque a reserva energética não é
suficiente para sustentar o metabolismo anaeróbio e produzir ácido lático capaz de
fazer baixar o pH a 5,5 na 24a. hora post mortem.
A carne resultante desse processo terá pH>5,8 (Tarrant 5 ), que proporciona às
proteínas musculares uma alta capacidade de retenção de água, mas será escura,
com vida de prateleira mais curta, que, segundo Gil & Newton 6, se dá porque na
ausência de ácido lático e glicose livre as bactérias utilizam os aminoácidos da carne
com produção de odores desagradáveis. Para Shorthose 7, essa carne com pH alto
também pode apresentar uma descoloração esverdeada, causada por bactérias que
produzem H2S.
3
A esse tipo de anomalia dá-se o nome de “Dark-cutting beef” (carne bovina de
corte escuro) ou DFD (“dark , firm and dried”, ou escura, firme e seca).
No Brasil, não há estatísticas de ocorrência de DFD, mas nos Estados Unidos
a incidência é de 3% dos bovinos abatidos, ficando o valor das carcaças reduzido em
20-40% 4. Na Finlândia, um estudo de 1979 revelou uma incidência de 26,3% das
carcaças de 6909 tourinhos, 13,6% em 3042 vacas e 12,6% em 1735 novilhas 8 .
Depois da introdução de uma série de modificações no manejo pré-abate a incidência
de DFD caiu para 5% em tourinhos e <2% em outras categorias. O autor salientou
que mais de 50% da carne produzida na Finlândia provém de tourinhos, que,
segundo ele, são sujeitos ao estresse hierárquico.
Shorthose 7 relatou que cerca de 8% do gado abatido na Austrália, excluindose
animais de um ano e machos inteiros, apresentam carne com pH24h>6,0. Relatou
também pesquisa feita com 3.000 bovinos, terminados em pastagem ou
confinamento, abatidos em diversos lotes. Somente 16% dos lotes de pastagem,
contra 70% dos lotes de confinamento, tinham menos de 5% de incidência de DFD
(pH>5,7). O autor atribuiu a diferença ao temperamento mais calmo dos animais de
confinamento.
3.2. Genética
Embora seja possível que existam diferenças genéticas capazes de afetar a
extensão do metabolismo post mortem e, consequentemente, as propriedades físicas
da carne bovina, referências a elas não estão disponíveis na literatura usualmente
consultada, exceto por algumas menções à maior incidência de DFD em espécimes
de dupla musculatura. Não se descarta, entretanto, a possibilidade de que os
modernos e eficientes métodos de seleção venham a produzir alterações bioquímicas
na capacidade de estocar e mobilizar glicogênio. Inclusive, porque há evidências de
que raças ou linhagens que se caracterizam pela facilidade de metabolizar gordura
sejam mais susceptíveis ao estresse do que aquelas que acumulam gordura 5 .
A herança genética também parece ter uma grande influência na velocidade e
extensão da proteólise que se verifica no processo de conversão do músculo em
carne, ocasionando diferenças consideráveis na maciez da carne. Para Koohmaraie9,
85% da variabilidade na maciez podem ser atribuídos às variações no processo
enzimático que leva à tenderização da carne bovina, conhecido como maturação. Os
15% restantes seriam devidos às diferenças em “marbling” (gordura intramuscular) e
colágeno. Note-se que o autor deve estar se referindo aos cortes de preparação
rápida com calor seco, como o contrafilé (músculo L. dorsi), pois, nos cortes
usualmente empregados em preparações lentas, com umidade, o colágeno é
preponderante.
Segundo Whipple et al. 10, a carne de gado europeu (Bos taurus) já estaria
passando por um processo de maturação nas 24 primeiras horas post mortem,
enquanto a de Bos indicus e seus mestiços teria um processo mais lento nas
semanas seguintes e, ao que parece, quanto maior a participação de Bos indicus no
genótipo, menor a velocidade e a extensão dos efeitos da maturação.
Norman 11, trabalhando no Brasil com as raças Nelore, Guzerá, Charolesa e
Canchim, verificou que os zebuínos tinham carne mais dura do que as raças
4
Charolesa e Canchim. Luchiari Filho 12 também relatou resultados de uma pesquisa
conduzida por ele, R.C. Margarido, P.R. Leme e C. Boin, com 270 novilhos que
haviam sido confinados por 90 dias, em que a carne dos nelores foi mais dura do que
a média de cada um dos sete grupos de cruzados 1/2 e 3/4 nelore e um grupo de
bubalinos - média de força de cisalhamento WB de 4,5kg contra 3,3 a 4,0kg.
Crouse et al.13 relataram que a participação de Bos indicus (0,25, 50 e 75%
Brahman ou Sahiwal) nos cruzamentos resultou em carne mais dura. Comparados
aos mestiços de raças britânicas, com média de força de cisalhamento do músculo L.
dorsi, de 4,4kg, os mestiços 1/4, 1/2 e 3/4 Brahman ou Sahiwal deram médias de 5,2,
5,8 e 6,7kg ou 5,6, 6,6 e 8,4kg, respectivamente. O mesmo grupo de pesquisadores
encontrou uma explicação para o fato na maior atividade bioquímica de um fator
inibidor de proteases cálcio-dependentes (CDPI e CDPII) nos zebuínos.
Tal fator inibiria a degradação de certas proteínas miofibrilares, retardando a
maturação da carne de Bos indicus. Oliveira14 não encontrou diferenças significativas
entre os grupos genéticos Nelore e Canchim-Nelore na maciez do contrafilé (5,9 vs.
5,3kg) e coxão mole (5,8 vs. 5,5kg) de novilhos de 24-30 meses de idade terminados
em confinamento, provavelmente devido ao tamanho da amostra estudada (20 de
cada grupo) .
Coeficientes de herdabilidade na faixa de 0,10 a 0,60 são encontrados na
literatura para as características: gordura subcutânea e intramuscular, concentração
de mioglobina e maciez da carne.15 Entretanto, é pouco provável que os criadores
venham a selecionar ou orientar acasalamentos com base nessas características,
com tantas outras, produtivas e reprodutivas, a serem consideradas no
melhoramento genético de bovinos de corte.
As raças também diferem quanto às curvas de crescimento dos tecidos e,
consequentemente, ao menor ou maior acúmulo de gordura, ou ainda, quanto ao
peso e espessura dos músculos ou cortes cárneos a um determinado peso de
carcaça. Essas características são interligadas aos atributos visuais e organolépticos
da carne, sendo apreciadas ou discriminadas dependendo do mercado que se
considera. Assim, no futuro, para as exportações de carne desossada do Brasil para
a União Européia, é provável que se dê preferência para os cruzamentos de
zebuínos com raças de acabamento tardio, que dão carne relativamente magra e
cortes mais pesados do que os cruzados de raças britânicas.
Diferenças genéticas também se verificam na cor da carne. Alguns autores
demonstraram maiores concentrações de mioglobina e, consequentemente, menores
índices de reflexão de luz nas raças Simental, Chianina, Nelore e Guzerá, do que nas
raças Limousine, Charolês e Canchim.
3.3. Alimentação
Os efeitos dos sistemas de alimentação e dos níveis nutricionais nas
características das carcaças bovinas são fartamente documentados na literatura.
Sabe-se, por exemplo, que sempre que o nível energético da ração excede as
exigências mínimas para o desenvolvimento muscular, verificam-se acúmulos de
gordura na carcaça. Desse modo, a influência da alimentação é confundida com o
grau de acabamento.
5
A exigência de acabamento nas carcaças é bem conhecida dos pecuaristas
brasileiros, mormente após o Plano Real que estabilizou o preço da arroba de gado
mantendo altas as taxas de juros. Como decorrência, eles têm procurado aumentar a
produtividade dos rebanhos vendendo bovinos jovens para abate, mas têm
encontrado resistência nos compradores que, entre outras coisas, alegam falta de
acabamento nas carcaças de menos de 16 arrobas (240kg). Essa falta de
acabamento é um fato inegável, principalmente quando se trata de novilhos cruzados
de raças européias continentais, ou machos inteiros, zebuínos ou não. Para
apresentar acabamento, esses animais deveriam ser abatidos ao atingirem 500kg de
peso vivo16.
Nas últimas três décadas, a gordura de cobertura vem se tornando um
importante indicador de qualidade, primeiro, porque aponta para o tipo de
alimentação recebida pelo bovino, que parece influir na solubilidade do colágeno da
carne. Segundo, porque afeta diretamente a velocidade de resfriamento da carcaça,
comportando-se como um isolante térmico e interferindo no processo de conversão
do músculo em carne, como será visto mais adiante.
Além disso, carcaças com melhor acabamento tendem a apresentar um maior
teor de gordura intramuscular, “marbling”, ou gordura entremeada, que é depositada
com maior intensidade na fase de engorda dos bovinos, após o término da fase de
crescimento, sempre na dependência da raça e do nível energético da dieta, sendo a
última na escala de prioridades. Atualmente, a importância do “marbling” é discutível.
A sua presença em proporções visíveis a olho nu (>4% de extrato etéreo na matéria
original) indica que o animal foi bem alimentado e deixa a carne mais macia,
saborosa e suculenta. Porém, a tendência no Brasil como na Europa e numa parte da
população norte-americana, é de que tais vantagens sejam trocadas pelo consumidor
por um produto inferior nesse aspecto, porém, tido como mais saudável, qual seja, a
carne desprovida de gordura visível.
Num levantamento de opinião de gerentes de estabelecimentos que vendem
carne no varejo, em Campinas e região, constatou-se que nas casas de carne e nos
supermercados existe um consenso de que os consumidores não gostam de carne
com gordura entremeada, embora três de seis gerentes de hipermercados tenham se
expressado favoravelmente a essa característica.17
Medeiros et al.18 fizeram uma pesquisa muito interessante, contrastando os
escores e opiniões entre um painel de degustadores treinados, um painel de donasde-
casa e um grupo de pessoas que participaram de teste mercadológico, a respeito
de maciez, sabor/aroma, suculência e aceitação global da carne de dois grupos de
bovinos jovens. Um dos grupos foi terminado durante o verão em regime de pasto
irrigado, e abatido com peso médio de carcaça de 235kg e 0,38cm de gordura
subcutânea. O outro, terminado em 100 dias de confinamento com ração de alta
energia contendo 80% de concentrado, foi abatido com peso médio de 336kg de
carcaça, 1,09cm de gordura.
O painel de degustadores treinados foi capaz de detectar diferenças de
maciez, suculência e sabor/aroma favoráveis à carne de contrafilé do gado confinado,
mas não acusou diferenças de maciez e suculência do coxão mole, apenas de
sabor/aroma.
As donas-de-casa tiveram a chance de comprar um traseiro ou um dianteiro,
sem saber a que grupo pertencia e depois de comer a carne atribuíram notas. Neste
caso também foram atribuídos maiores escores de maciez, suculência e sabor/aroma
6
aos cortes de carne do gado confinado e 100% das que compraram essa carne
(gorda) disseram que comprariam novamente, contra 73% das que compraram carne
(magra) do gado de pastagem.
No teste mercadológico os pesquisadores usaram material publicitário para
atrair os consumidores para a carne magra. O material descrevia essa carne como
sendo de “baixo teor de gordura” e “natural”, assim: “A porção comestível do
Wyoming Lean Beef contém somente 3,5% de gordura. Uma porção (90g) dessa
carne tem menos de 150 calorias. Essa carne não contém ingredientes artificiais...”,
ou então: “De todo o Wyoming, vem o gado escolhido com muito critério para ser
comercializado como Wyoming Lean Beef. Essa carne é inspecionada pelo USDA.
Pesquisas feitas na Universidade do Wyoming demonstraram o baixo teor de gordura
do Wyoming Lean Beef”.
Resultado: as compras dessa carne foram o dobro das de carne de gado
confinado. Quem comprou a carne magra disse nas entrevistas que teve uma reação
positiva ao material promocional e gostou da aparência do produto, em termos de
cor, ausência de desperdício, “valor nutritivo” e da não utilização de hormônio e
antibióticos, conforme indicava o material. Após repetirem a compra do mesmo tipo
de carne algumas vezes, 68% dos consumidores diziam estar completamente
satisfeitos, 30% moderadamente satisfeitos e somente 2% insatisfeitos. Os
consumidores diziam apreciar a carne magra, exceto pela textura um pouco dura,
mas assim mesmo compravam porque essa era “natural, com baixo teor de gordura,
e com marca do produtor”. Concluiu-se que enquanto os provadores julgavam
características sensoriais apenas, os consumidores davam prioridade para o que
consideravam ser bom para a saúde.
3.4. Idade ou maturidade
Dependendo do tipo de alimentação fornecida, os bovinos atingem o peso
desejável de abate mais jovens ou mais velhos. Quanto mais velhos maior será a
concentração de mioglobina nos músculos e, portanto, mais escura será a carne. A
cor da gordura também é afetada pela idade de abate, ficando amarelada como
decorrência da deposição prolongada de carotenóides oriundos das forragens.
A influência da idade, ou maturidade, tem sido motivo de boas discussões há
muito tempo, com os pecuaristas reclamando melhores preços para carcaças de
bovinos jovens. Depois, com os programas de incentivos fiscais para estimular a
produção de novilhos “precoces”. E, mais recentemente, com a necessidade
premente que os pecuaristas estão sentindo de reduzir a idade de abate dos bovinos
como consequência do plano de estabilização da economia. Em todas as
oportunidades, argumenta-se que a carne de gado jovem é de melhor qualidade, sem
definir qualidade, ou então, alega-se que é uma carne mais macia, sem apresentar
dados que justifiquem a afirmação.
O fator maturidade é comum a todos os sistemas de tipificação de carcaça
bovina, porque há evidências de que a qualidade organoléptica da carne,
principalmente a maciez, piora com o avanço da idade 19 , possivelmente em
decorrência de alterações que ocorrem no colágeno intramuscular. 20
7
Smith et al. 21 demonstraram que enquanto a maturidade das carcaças passa
de USDA 22 A (aproximadamente 2 anos), para B (até 42 meses), a força de
cisalhamento (WB) do contrafilé maturado por 8-10 dias aumentou de 3,23 para
3,39kg, os escores de sabor/aroma, maciez e aceitação global tiveram uma pequena
redução, e a suculência não foi afetada. Passando de B para C (>42 meses), de C
para D (@ 4 anos), e de D para E (@ 5 anos), ocorreram sucessivos incrementos na
força WB e reduções nos escores de maciez e aceitação global, como se vê na
Tabela 1.
Considerando que na tipificação americana somente as carcaças de
maturidade A e B podem ser enquadradas nos melhores tipos (Prime, Choice, Select
e Standard), sendo as demais rebaixadas para os tipos inferiores (Commercial, Utility,
Cutter e Canner), os autores chamaram a atenção para o fato de que as diferenças
são muito pequenas, e não ocorrem abruptamente, a ponto de justificar um corte tão
drástico como esse.
Tabela 1. Médias dos escores de análise sensorial e força de cisalhamento
(WB) de bifes de contrafilé, por grupo de maturidade USDA, segundo Smith et
al.21
Maturidade Análise sensorial* Força
USDA N “Flavor” Suculência Maciez Global WB (kg)
A 60 6,31a 6,74a 7,02a 6,58a 3,23a
B 28 5,76b 6,64a 6,48b 6,12b 3,39b
C 47 5,68bc 6,46ab 6,14c 5,77c 3,71c
D 39 5,45c 6,34b 5,89c 5,55c 4,13d
E 21 5,53bc 6,45ab 5,10d 5,17d 4,72e
a,b,c,d Médias na mesma coluna seguidas de uma letra comum, não diferem (P>0,05).
*1= extrem. indesejável em flavor, seca, dura ou indesejável no global; 9= extrem. desejável em
flavor, suculenta, macia ou desejável no global.
Ainda a respeito do trabalho de Smith et al. 21, é interessante salientar que: 1)
todas as carcaças selecionadas tinham “marbling” USDA “slight”, “small” e “modest”
(diferentemente do que ocorre com o gado zebu brasileiro, que raras vezes atinge o
grau “small”); 2) todas as classes de maturidade deram carne numa faixa de valores
aceitáveis de maciez (WB<5,0 e maciez sensorial >5,0), mas principalmente as
classes A, B e C, portanto, animais de até quatro anos podem ter carne macia, e 3)
mesmo as classes de maturidade D e E deram contrafilés maturados tão ou mais
macios do que os de zebuínos comumente encontrados no Brasil, o que pode estar
mostrando que há outros fatores que exercem mais influência na maciez do contrafilé
do que a maturidade da carcaça.
Um outro trabalho muito interessante a esse respeito é de Gullett, Jones &
Hines 23. Esses pesquisadores da Universidade de Guelph compararam contrafilés,
de fêmeas de descarte de gado leiteiro, com quatro incisivos permanentes (@36
meses), tipificadas como Canadá C1, com os de outras com oito dentes (>60 meses),
8
tipificadas como D1. As vacas foram compradas ainda magras e alimentadas nas
mesmas condições. Eles concluíram que não houve diferença na textura (força de
cisalhamento - WB) das amostras (cilindros de 2,54cm de diâmetro) de contrafilés
assados no forno a 169°C, até a temperatura interna de 65-68°C, entre os grupos de
carcaças C1 e D1.
Em estudo realizado no Estado de São Paulo 24 , com três grupos de carcaças,
denominados I, II e III, maturidade óssea USDA 22 A, C e E, respectivamente,
nenhuma diferença significativa foi encontrada entre os grupos nas comparações de
força de cisalhamento (WB) ou na avaliação organoléptica dos bifes de contrafilé. As
carcaças dos grupos II e III eram mais pesadas e mais gordas do que as do grupo I.
Verificou-se também um aumento do teor de lipídios intramusculares ( I=2,2%,
II=3,5% e III=3,6%) com o avanço da maturidade, e uma correlação negativa entre
teor de lipídios e WB (r = -0,49). Assim, é possível que qualquer vantagem potencial
do grupo I tenha se perdido em decorrência da falta de acabamento das carcaças
desse grupo.
É importante salientar que esses trabalhos foram destacados de uma série
mais ampla, sobre o mesmo assunto, com o propósito de mostrar que a influência da
idade do bovino, ou da maturidade da carcaça, é uma questão muito mais complexa
do que parece àqueles que clamam por melhores preços para o gado jovem de
abate. Certamente, existem outros artigos científicos em que se pode constatar um
apreciável efeito da idade, especialmente após os 42 meses, mas é preciso manter
sob controle os fatores post mortem, para que os efeitos da idade se manifestem.
4. FATORES POST MORTEM
Dentre os fatores post mortem, ou extrínsecos, isto é, aqueles que estão fora
do controle do pecuarista, destacam-se o resfriamento e a estimulação elétrica das
carcaças, a maturação e o método de cocção da carne. Exceto por esse último, os
demais exercem a sua influência nas propriedades físicas da carne bovina durante ou
após o desenvolvimento do rigor mortis.
4.1. Resfriamento
O resfriamento rápido das carcaças é desejável para se ter redução de perdas
de peso, de desnaturação de proteínas e de proliferação de microrganismos, e maior
oxigenação da mioglobina da superfície dos músculos, conferindo-lhes a cor
vermelho vivo.
Entretanto, o abaixamento rápido da temperatura dos músculos, no início do
desenvolvimento do rigor mortis, pode provocar o endurecimento da carne. A
explicação desse fenômeno, denominado “cold shortening” (encurtamento pelo frio),
pode ser encontrada no trabalho de Marsh 25. Segundo esse autor, os músculos da
carcaça são estimulados a contrair quando expostos a baixas temperaturas na fase
que antecede o rigor mortis. Para ele, o “cold shortening” é um problema de origem
recente, que tem suas causas associadas às exigências de rapidez no resfriamento.
9
A capacidade do músculo para contrair pelo estímulo do frio declina com o
passar do tempo post mortem. E, quando os filamentos contrácteis de actina e
miosina formam actomiosina, antes da temperatura muscular cair abaixo de 10°C,
não mais ocorre “cold shortening”. Assim, a solução para evitá-lo seria deixar as
carcaças a temperaturas acima de 10°C até o estabelecimento do rigor mortis (50%
do ATP inicial, pH=6,0 ou 10 horas após a sangria) e, então, reduzir rapidamente a
temperatura. Tal prática foi adotada na Nova Zelândia, entre 1968 e 1977, para evitar
o endurecimento da carne de ovinos exportada para a América do Norte, enquanto os
pesquisadores daquele país procuravam soluções econômicas para o problema, já
que esse sistema de resfriamento lento é considerado anti-econômico pela indústria
de abates.
Ao final da década de 70, o professor Marsh visitou abatedouros do Estado de
São Paulo, fez medições de temperatura e concluiu que o “cold shortening” é uma
constante nas carcaças relativamente leves e magras do nosso mercado, em virtude
dos eficientes sistemas de refrigeração aqui empregados. A sua recomendação,
publicada com Cia e Takahashi, foi para se desligar os forçadores de ar da câmara
durante o carregamento, quando a temperatura estiver abaixo de +5°C, e voltar a
ligar a ventilação após completar a carga da câmara. 26
Bouton et al.27 demonstraram que em carcaças leves e magras, resfriadas em
câmara fria entre 0 e +5°C, e velocidade do ar de 0,8m/s, qualquer vantagem da
carne de bovinos jovens, em termos de maciez, será perdida para o “cold shortening”,
fazendo, inclusive, que essa carne seja mais dura do que a de bovinos mais velhos
que, geralmente, são mais pesados e têm melhor acabamento.
4.2. Estimulação elétrica
A estimulação elétrica (EE) das carcaças, com aparelhos de baixa voltagem,
nos primeiros 10 minutos após a sangria, ou com altas voltagens na primeira hora
post mortem, constitui uma técnica desenvolvida e patenteada por Harsham &
Deatherage 28 com o objetivo de tornar a carne mais macia. É interessante salientar
que à época do registro de patente (1951) o fenômeno do “cold shortening” ainda não
era conhecido.
Na década de 70, a EE foi redescoberta por pesquisadores neo-zelandeses
que precisavam encontrar uma solução eficaz para o problema da falta de maciez da
carne ovina, motivo de muitas reclamações dos importadores. E, depois disso, foi
objeto de pesquisas em diversos países, inclusive no Brasil 29, sempre com o objetivo
de acelerar o rigor mortis, de modo a evitar o encurtamento das fibras musculares e o
conseqüente endurecimento da carne durante o resfriamento, ou congelamento,
comprovando-se sua eficácia restrita aos músculos mais superficiais, como é o caso
do L. dorsi (contrafilé).
A EE das carcaças também exerce influência positiva na cor da carne, porque
acelera o declínio de pH, provavelmente aumentando a desnaturação de proteínas.
Além disso, a EE pode ser uma alternativa de baixo custo, que seria de extrema
utilidade para melhorar a qualidade da carne produzida no Brasil, principalmente no
que se refere às carcaças de bovinos jovens com acabamento insuficiente.
10
4.3. Maturação
A tenderização da carne que ocorre após o rigor mortis, durante a estocagem
refrigerada, denominada maturação, é conhecida desde o início do século. Porém, as
explicações para as modificações na estrutura das miofibrilas que tornam mais macia
a carne maturada são recentes.
A maturação é um processo complexo, afetado por muitas variáveis, tais como
a idade e espécie - ou raça - do animal, velocidade de glicólise, quantidade e
solubilidade do colágeno, comprimento do sarcômero das miofibrilas, força iônica e
degradação das proteínas miofibrilares.
Koohmaraie 30 resumiu as modificações químicas e estruturais do processo de
maturação da carne, no que diz respeito ao componente miofibrilar, como segue:
1. Enfraquecimento e/ou degradação do disco Z.
2. Degradação da proteína desmina, provavelmente com ruptura de pontes
entre as miofibrilas.
3. Degradação da proteína titina, que liga filamentos de miosina, no sentido
longitudinal das miofibrilas.
4. Degradação da proteína nebulina (ligações transversais na banda I dos
sarcômeros).
5. Desaparecimento de troponina T e aparecimento simultâneo de polipeptídeos
com peso molecular entre 28 e 32 kDa.
6. Aparecimento de um polipeptídeo com PM de 95 kDa.
7. As proteínas contrácteis miosina e actina não são afetadas.
Segundo esse autor, os itens 1 e 2, e, provavelmente o 3, são os responsáveis
pela crescente fragilidade das miofibrilas durante o processo de maturação.
Muito tem sido escrito desde o início dessa década sobre o envolvimento de
um sistema enzimático denominado “calpaínas”, como o principal responsável pela
proteólise que conduz à tenderização da carne. Tal sistema seria formado de duas
calpaínas (I e II) ativadas pelo cálcio livre (não retido no retículo sarcoplasmático ou
nas mitocôndrias) e inibidas por uma outra enzima denominada calpastatina.
Dransfield 31, por exemplo, demonstrou que 65% da variação na maciez da carne
maturada pode ser explicada pela variação na atividade da calpaína I. Depois, em
1993, publicou um modelo de tenderização de carne baseado na ativação das
calpaínas, pelo aumento na concentração de cálcio livre, no desenvolvimento do rigor
mortis - o declínio de pH de 6,5 a 5,7 aumenta a atividade da calpaína I, de 15 a 97%
da atividade máxima da enzima. O modelo compreende ainda a inibição das
calpaínas pela calpastatina e a inativação de calpaínas e calpastatina por autólise, na
medida em que se dá a tenderização.32
Considerando que o nível de atividade da calpastatina na 24a. hora post
mortem é altamente correlacionado com a maciez da carne maturada por 14 dias,
medida pela força de cisalhamento (r=0,66), isto é, quanto maior a atividade de
calpastatina mais dura será a carne, Whipple et al. 10 postularam que seria essa a
razão das diferenças na maciez da carne entre Bos indicus e Bos taurus. Diante
disso, o grupo de pesquisadores do USMARC (United States Meat Animal Research
Center) passou a trabalhar com a hipótese de que a seleção contra elevados índices
11
de atividade de calpastatina poderia levar a uma melhoria na maciez da carne e
conduziram uma pesquisa para determinar as herdabilidades dessa característica e
da força de cisalhamento, e a correlação genética entre elas, tendo encontrado
valores de 0,65 e 0,53 para as herdabilidades e 0,50 para a correlação (Schackelford
et al.33 ).
Ormenese34 comparou a eficácia de dois processos de maturação: o
convencional da carne embalada à vácuo, e o Tender-TainerÒ de acondicionamento
sob pressão positiva em tanques especiais, mantidos a -1 a 2°C, por períodos de 1,
14, 21 e 28 dias de maturação. Utilizou 16 meias carcaças de machos castrados da
raça Nelore, de quatro anos de idade e comparou os processos e períodos através
da força de cisalhamento e análise sensorial dos músculos L. dorsi (Ld, contrafilé),
Gluteus medius (Gm, alcatra), Semimembranosus (Sm, coxão mole), Semitendinosus
(St, lagarto) e Vastus lateralis (Vl, patinho). Ambos os processos melhoraram
continuamente a maciez da carne de Ld, Gm e Sm. A melhoria foi pequena para St e
não significativa para Vl. Verificou-se que existe uma correlação positiva (r=0,77;
p<0,001) entre os valores de WB dos dias 1 e 28, que permitiria classificar, no
primeiro dia post mortem, a carne resfriada quanto ao resultado esperado após a
maturação.
No trabalho de Ormenese, está assinalado que foram necessários 28 dias de
maturação para que a força de cisalhamento do contrafilé (Ld) caísse de 72,4±11,8N
(cada N equivale a 10kg) para 50,9±12,8N, e, o mesmo período para que a da
alcatra (Gm) caísse de 70,8±14,4N para 50,0±11,2N, o que significa que
aproximadamente 50% das amostras de contrafilé e alcatra chegaram ao limite de
50N, considerado aceitável pelos provadores. Os outros cortes estudados não
atingiram esse limite mesmo após 28 dias.
Há evidências de que a maturação pode melhorar em cerca de 25% a maciez
da carne, mas sua eficácia é bem menor em carcaças de bovinos de quatro ou mais
anos, bem como naquelas que sofreram um rigoroso “cold shortening”.
Em experimento realizado em Campinas-SP 35, com novilhos Nelore e
Pitangueiras de dois e três anos de idade, verificou-se que as amostras de contrafilé
das meias carcaças do grupo controle foram muito duras, independentemente da
raça ou idade de abate. Nas meias carcaças correspondentes, a estimulação elétrica
(EE) reduziu em 21-33% a força necessária (Warner Bratzler, kg) para cisalhar
cilindros de 1,27cm de diâmetro de bifes assados de contrafilé. A maturação por 14
dias, em embalagem à vácuo e câmara fria à temperatura de 0 a 2C, foi menos
eficaz do que a EE, porém, quando os dois fatores foram combinados, a carne ficou
ainda mais macia, principalmente nas carcaças dos novilhos Pitangueiras (5/8 Red
poll 3/8 Zebu) de dois anos de idade, como está demonstrado na Figura 1.
12
Ne
2anos
Ne
3anos
Pi
2anos
Pi
3anos
0 1 2 3 4 5 6 7 8
WB (kg)
Raça e idade
Figura 1. Textura do contrafilé de novilhos Nelore
(Ne) e Pitangueiras (Pi), de 2 e 3 anos de idade.
Controle
Mat.14d.
EE
EE Mat.14d.
4.4. Métodos de cocção
O método de cocção tem uma influência marcante na qualidade organoléptica
da carne. Um método inadequado pode por a perder todo o esforço feito nos
segmentos de produção, abate e comercialização, para se ter uma carne de boa
qualidade. Pode, por exemplo, promover o endurecimento, o ressecamento e a perda
de sabor e aroma da carne preparada para consumo.
A temperatura, a presença ou não de umidade, o tempo de cozimento e a
temperatura final no interior da carne são importantes variáveis que devem ser
controladas de acordo com o tipo de músculo, para se aproveitar ao máximo as
propriedades de cada corte cárneo. Obviamente, isso tudo é feito nas cozinhas
domésticas ou de restaurantes, de um modo muito prático, sem qualquer sofisticação
técnica. Entretanto, é importante saber que alguns cortes cárneos, com menor teor
de colágeno, como o filé, contrafilé e alcatra, devem sofrer uma cocção rápida com
calor seco, até 62-70°C, de acordo com a preferência por “mal passado”(cor rosada),
médio (cor rosa acinzentado), ou “bem passado” (cor marrom acinzentado), enquanto
outros, com maior teor, como o coxão duro, acém e músculo, devem ser cozidos na
presença de líquido (ou vapor), que pode ser o da própria carne embalada em
material impermeável, pelo tempo necessário para gelatinizar o colágeno.
Judge et al. 4 assinalaram que certos procedimentos, que causam
desidratação, resultam em perda de suculência da carne. A temperatura interna ao
final do processo também exerce grande influência no teor de umidade restante, e,
consequentemente, na suculência da carne. Os mesmos autores deram como
exemplo uma carne contendo 68-75% de umidade, que, depois de assada em forno
até temperaturas internas de 60, 70 ou 80°C, conterá 70, 65 ou 60% de umidade,
respectivamente.
13
5. CONSIDERAÇÕES GERAIS
Neste trabalho foram apresentados os mais importantes fatores que
influenciam na qualidade organoléptica (visual e gustativa) da carne bovina. Com
exceção da idade de abate e do método de cocção, os fatores ante e post mortem
discutidos aqui exercem, direta ou indiretamente, alguma influência no processo de
estabelecimento e resolução do rigor mortis.
O segmento de produção de bovinos pode ter um papel importante na
melhoria da qualidade organoléptica da carne, aprendendo a controlar as variáveis
causadoras de estresse; fazendo melhoramento genético para características
produtivas e reprodutivas, e adotando sistemas de manejo e alimentação que
possibilitem o abate de tourinhos de 18 a 24 meses e de novilhos(as) de 24 a 30
meses, com peso de carcaça compatível com as necessidades mínimas de
acabamento. Esse peso mínimo deverá variar com o sexo, idade de castração, raça
ou cruzamento, e sistema de alimentação, sendo que as combinações mais
interessantes dessas variáveis, para maximizar o resultado econômico, sem
comprometer a qualidade da carne, terão que ser encontradas em trabalhos
colaborativos com o segmento industrial.
O segmento industrial, para ser competitivo, terá que se modernizar,
incorporando pessoal de nível universitário, potencialmente capaz de compreender
as causas de variação dos atributos qualitativos da carne, para que possa exercer
uma ação efetiva nos processos de melhoria da qualidade. Terá ainda que, em
conjunto com o segmento de comercialização, detectar tendências nas preferências
dos consumidores, transmitindo suas impressões aos pecuaristas através de um
sistema de classificação de carcaças, que possa funcionar como linguagem comum a
todos os segmentos que compõem a cadeia produtiva.
Entretanto, tudo que foi tratado aqui é pouco diante da problemática da (falta
de) confiabilidade que vem abalando o setor. Isto diz respeito à crescente
desconfiança quanto à qualidade higiênico-sanitária da carne, decorrente do
distanciamento do Ministério da Agricultura do seu papel como responsável pela
inspeção dos abates. Diz respeito, ainda, à falta de organização do setor para se
contrapor, com informações científicas seguras, às investidas da mídia, que procura
relacionar doenças humanas, principalmente as coronarianas, com o consumo de
carnes vermelhas.
É preciso chamar a atenção para o fato de que as carnes vermelhas são
amplamente reconhecidas como as principais fontes de proteínas de alto valor
biológico, minerais - ferro, zinco, fósforo e magnésio - e vitaminas como tiamina,
riboflavina, niacina, B6 e B12, tudo isso compondo um alimento de alta densidade
nutricional, isto é, de baixo valor calórico.
Essas e outras situações que, justa ou injustamente, colocam o setor na
defensiva, estão à espera de ações eficazes de gerenciamento da qualidade em toda
a cadeia produtiva, que deverão ser implementadas pelo conjunto das lideranças de
todos os segmentos que compõem o setor da carne bovina.
14
NOTAS BIBLIOGRÁFICAS
(na ordem em que aparecem no texto)
1 Campos, V.F. 1992. Controle da Qualidade Total (no estilo japonês). 3a.ed. Belo Horizonte-MG: Fundação
Cristiano Ottoni, 220p.
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p.43-52.
3 Pardi, M.C. et al. 1993. Ciência, Higiene e Tecnologia da Carne - Vol. 1. Editora Universitária (Eduff) e
Editora UFG, Goiânia-Go, p.77
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Development Corp. Sydney South, p.68-73.
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brasileira. In: Anais do I Congresso Brasileiro das Raças Zebuínas, ABCZ, Uberaba-MG,p.72-9.
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